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O Novo Código Civil e o Direito de Família – II

O Novo Código Civil e o Direito de Família – II

PARTE- I – Por FÁBIO BÖCKMANN SCHNEIDER.

Atento a esta realidade é que a Constituição, em seu artigo 226 proclama:

“Art. 226- A família, base da sociedade, tem especial proteção do estado.”

Sobre o assunto, ensina o eminente jurista Washington de Barros Monteiro:
“Todo homem, ao nascer, torna-se membro integrante de uma entidade natural, o
organismo familiar. A ela conserva-se ligado durante toda a sua existência, embora venha a constituir nova família pelo casamento. O entrelaçamento das múltiplas relações estabelecidas entre os componentes da referida entidade, origina um complexo de disposições, pessoais e patrimoniais, que formam o objeto do direito de família.

Desde logo, evidencia-se a importância desse estudo, tão perto e ligado à própria vida. Dentre todas as instituições, públicas ou privadas, a família reveste-se de maior significação. Ela representa sem contestação, o núcleo fundamental, a base mais sólida em que repousa toda organização social.”

Sendo a família um fenômeno cultural, representa a consolidação de vivências , estando condicionada, também, às circunstâncias de seu tempo. Por este motivo é
que ao longo de sua existência passa por transformações de conteúdo e de forma. O legislador não pode desconhecê-las, devendo atuar no sentido de incorporá-las ao ordenamento jurídico, proporcionando segurança e estabilidade como valores indispensáveis para a sua plena realização.

As mudanças ocorridas desde a promulgação do Código Civil vigente foram muitas. A evolução dos costumes, a liberação sexual, o movimento feminista, a evolução do pensamento científico, a informática, a modernização dos meios de produção, impactaram de forma definitiva a estrutura familiar.

Analisando o fenômeno da evolução da família moderna, o saudoso mestre Orlando Gomes, citando o jurista francês Carbonnier, identifica as seguintes tendências: a
estatização, a retração, a proletarização, a democratização, a desencarnação e a dessacralização. Sobre elas diz: “A estatização caracteriza-se pela crescente ingerência do Estado nas
relações familiares, por dois modos: substituindo a família em
numerosas e importantes funções, como a função educativa e a função alimentar, controlando-a no exercício das funções que conserva.

A retração observa-se na substituição da família patriarcal, existente apenas nos retratos de bodas de ouro, pela família conjugal constituída de pai, mãe e filhos menores, com tendência a se transformar na família segmentar, a grande novidade na evolução familiar, adiante conceituada.

A proletarização verifica-se pela mudança do caráter das relações patrimoniais da família, determinante do desaparecimento do seu aspecto capitalista, ainda na classe média. O grupo doméstico deixou de ser entidade plutocrática (Influência do dinheiro, preponderância dos mais ricos) para se fixar em relações do tipo alimentar que se traduzem em direitos e obrigações incidentes em salários ou rendimentos outros do
trabalho.

A democratização revela-se na irresistível tendência para transformar o casamento numa sociedade do tipo igualitário e a família numa companionship (burgess), cujo processo em curso acompanha o duplo movimento de emancipação da mulher e do filho. Nesse grupo democratizado, os sentimentos evoluíram e mudou a atitude psicológica.

Por desencarnação entende o mestre francês a substituição, em importância, do elemento carnal ou biológico pelo elemento psicológico ou afetivo e a conscientização de que na formação do homem pesa mais a educação do que a hereditariedade. Mais do que a voz do sangue fala a coexistência pacífica, senão a camaradagem.

Por último, a dessacralização do casamento, que o atinge uma vez realizado e se consuma na facilidade com que se rompe o vínculo, nos favores legais e jurisprudenciais ao concubinato e na indistinção entre filhos legítimos e ilegítimos,
inclusive os adulterinos.”

Observamos, porém, que a tendência de estatização está na contramão da evolução da família como agrupamento social básico, assentado na afeição entre os seus membros.

O Estado não tem o direito de tutelar os sentimentos e as relações íntimas dos indivíduos. A abordagem legislativa da família tem que ser clara no estabelecimento de princípios e na definição de institutos e seus conteúdos, sem, contudo, apresentar fórmulas herméticas que desconheçam a dinâmica social.

Quando o legislador pretende se imiscuir nas relações íntimas dos membros da família corre o risco de ser até obsceno, sem qualquer vantagem de ordem prática. Existe uma barreira ética a qual o legislador deve estar atento. Ultrapassá-la pode representar constrangimentos e desagregação do mais importante organismo social.

A sociedade necessita de institutos e instrumentos capazes de promover a preservação e o desenvolvimento da família igual e plural que aflorou da Constituição de 1988, através da garantia da igualdade e respeito entre os seus membros. A família bem
estruturada será propulsora da transformação social, rumo a uma sociedade nova, fundada no bem estar, na harmonia e na justiça.
A família, em seu processo evolutivo, se desincumbe de funções extraordinárias para encontrar a sua, que é ser local de amor, sonho, afeto e companheirismo.